_ Mas como assim o nome do personagem principal vai ser Sérgio?!… ele andava de um lado para o outro com um calhamaço de papéis nas mãos…
_ Bem, ele não é o personagem principal… ele é tipo, o “Robin” do Batman, sabe… quase principal… ela deu risadinhas disso colocando a mão sobre a boca…
_ Cara, isso não vai funcionar!… ele respondeu dando tapinhas sobre as folhas…
_ Adoro quando você me chama de cara… não que eu não seja também, apesar de eu ser mulher… mas em algum momento o substantivo cara foi bastante usando apenas para os “macho” né hahaha agora ela gargalhava sem pudor…
Ele olhou de volta para ela, os papéis estavam atrás de seu corpo agora que seus braços estavam cruzados… ele abaixou a cabeça sacudindo de leve… e deu risadas também!
_ Tá bom vai… ele se aproximou dela, ela sentada em um sofá de dois lugares… ele ficou de pé, próximo ao braço onde ela se encontrava recostada…
_ Bem, pensa comigo, é um nome comum, um sujeito comum, como nosso, sei lá… ele é o que, ou melhor, o que ele faz mesmo?!… um detetive?… um informante da polícia?… um sujeito que conhece muitas pessoas e por isso é importante para todo o argumento?
_ Na real não pensei muito sobre esse personagem… ele esfregou a barba que estava por fazer… _ Fiquei concentrado nela, gostaria que ela fosse a personagem principal, que toda trama fosse solucionada e girasse em torno de seus anseios e questionamentos… e é claro, sua profissão, terapeuta, é um excelente pano de fundo não acha?…
_ Sim, eu concordo… Ela se levantou do sofá soltando a almofada sobre ele, e se aproximou dele… _ Então, você tem um nome para ela, ou estamos nesse impasse?… ela terminou sua fala e desviou dele enquanto procurava a cafeteira estilo italiana para por no fogo aceso…
_ É que sem nenhum preconceito contra “Sérgios“… é só um nome… um nome para localizar nossos leitores, espectadores, quem quer que sejam… _ Eu acho um nome muito comum, muito de professor de antropologia, um sujeito num terno velho e puído de cor marrom, uma pasta a tiracolo, também marrom, óculos de aros grossos e aquela vozinha irritante de sabe-tudo… nenhum estereótipo real, é claro, no entanto, esse nome não me parece de alguém intrépido, corajoso sabe… é mais de alguém que estaria lecionando em uma sala de aula vazia por… séculos…
os dois ficaram em silêncio um tempo…
_ Nada contra professores, “pelamor“!…_ Eu também sou professor, minha principal disciplina é a de roteiro, você bem sabe, já faz alguns bons anos, e eu adoro… talvez seja por isso, seja um nome que caberia bem na minha infâmia…
Ela separou duas xícaras sobre a pia e serviu o café para eles…
_ Já estamos com tudo preparado? Tenho fome!… ela virou-se para ele com as xícaras na mão e foi se sentar…
a mesa estava preparada com pães franceses, biscoitos com gotas de chocolate e um pote de manteiga e outro de geleia de morango… ele sentou-se também aguardando a fala dela, e ao passar por ela, tocou-lhe o ombro com leveza…
_ Olha… ela recomeçou… esse nome é um nome bacana, é um nome de pessoas grandiosas também…
_ Como qualquer outro… ele a atravessou…
_ Bem, você já fez uma pesquisa sobre isso? Quais os nomes de protagonistas, antagonistas, sujeitos quaisquer de suas histórias, com milhões de características semelhantes a qualquer pessoa no planeta inteiro, incluindo você mesmo?…
Ele acabara de dar uma mordida no pão e se respondesse aquilo voariam farelos para todos os lados… ele pensou sobre a cena e preferiu guardar sua fala e engolir o pão…
_ Que seja!… ela bebericou o café… a história em si, o que achou dela? Demoramos alguns dias para escrever toda a trama, uma ideia linda sobre essa terapeuta e suas aventuras misteriosas ajudando esse carinha aí… e os nomes servirão para marcar, criarão as personalidades deles, afinal de conta, duas coisas são necessárias pra fazer isso funcionar…
_ …Emoção e empatia. Os leitores devem se inteirar com as personagens como se elas existissem de verdade, blá, blá… ele não se aguentava enquanto levava outro pedaço de pão à boca…
_ Você está muito chato, Péricles! Sério! Um reclamão!… ela terminou de beber o café e foi se levantando levando a xícara para a pia.
_ Deixa aí, não… ele levantou uma mão gesticulando o nada… _ Não precisa lavar não… agora ele se levantava…
ela olhou para ele… um misto de raiva, curiosidade, vontade, e até… amor…
ela deixou a xícara lavada no escorredor de pratos e com as duas mãos segurou nos ombros dele… eram quase da mesma altura, se ela não fosse um ou dois centímetros mais alta que ele…
_ Olha… ela disse baixinho se aproximando bem dele…
nesse momento os dois estavam posicionados um em frente ao outro, de perfil, luz das 16h:20m (hora sagrada onde todas as cores brilham suas verdadeiras faces), a praia ao fundo com aquele cheirinho característico e delicioso, um leve vento abanava as folhas nos coqueiros…
e eles se beijaram demoradamente…